quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Coisas antigas e atravessadas pedem revisão


27. Revendo trechos de nossa história

Quem tenha feito a leitura de “Exilados de Capela” (Edgard Armond) pode correlacionar a emigração européia e asiática para América como uma espécie de semelhante de exílio. Pode e não pode ser verdade. Os capelinos tinham uma conta a acertar, uma contribuição a dar ao planeta Terra e estavam marcados para retornar à Capela, como de fato, lá está descrito. Os emigrantes, em grande maioria, deixaram seus países para não perecer. A revolução industrial estava solapando a economia daquelas regiões e a única opção era escapar para regiões pouco habitadas com grandes extensões de terra. Italianos, alemães, poloneses, austríacos, eslavos, russos, japoneses, coreanos, chineses, etc. etc. vieram para as Américas fazer fundamentalmente agricultura e pecuária e servir-se da exuberância das árvores, animais silvestres, recursos hídricos, etc. Não voltaram para seus países de origem, exceto alguns poucos.
Como se deu a vida aqui na América e especialmente no Brasil?
Tivemos essa grande contribuição dos imigrantes. Aqui nasceram lavouras, pomares, hortas, indústrias de transformação, clubes, igrejas, escolas, pequenas cidades... O Brasil foi interiorizado. Mas esses “brasileiros” de sotaque acentuado sofreram muito para se afirmar como cidadãos abandonados que foram e ainda tiveram de enfrentar as repercussões de duas guerras envolvendo seus países natais e nascente política que colocava em lados opostos poderosos países do planeta.
O Brasil, em 1922, já com 100 anos de independência e todos nós ainda perplexos com a violência da I Grande Guerra e incomodados com os rumos da política e economia locais e a tomada do poder pelo Partido Comunista nos países liderados pela Rússia, vimos começar aqui um movimento de transição. Alguns brasileiros queriam tirar o Brasil da roça de café e do curral das vacas e colocá-lo na modernidade.
A Semana de Arte Moderna, grito nativista dos artistas e intelectuais de então, a fundação do Partido Comunista, a revolta dos tenentes com movimentos armados insurretos ditos nacionalistas, social-democratas e mesmo comunistas, em represaria ao conservadorismo que entregava a economia nacional nas mãos dos cafeicultores e dos estancieiros criadores de gado. Tempos agitados.
Isso viria desembocar num golpe de estado que colocaria Getúlio Vargas no poder por longos 15 anos. Mas que daria a largada para a industrialização nacional, para o rádio, a tevê e novos incrementos “nacionalistas” de modernidade. Este foi o tempo em que algumas figuras de proa da cultura nacional foram reveladas aqui e lá fora: Carlos Drummond, Graciliano Ramos, Portinari, Darci Ribeiro, Irmãos Vilas Boas, Guimarães Rosa, Carmen Miranda; surgiram centros culturais com inspiração nativista; houve a defesa do samba como ritmo símbolo da brasilidade. Houve outras iniciativas, que são muitas, como o nascimento do cinema nacional e os seus temas de impacto.
O estrangeirismo sempre abriu espaços através da cultura e muito das lutas nacionais era anteparo às invasões através do cinema, da música, da literatura, das artes em geral, rádio e tevê, além da economia. E o nativismo (entenda como sentimento nacionalista de quem nasceu aqui) sempre precisou de poetas, cantores, músicos, escritores, cineastas, líderes populares, para dar o recado “esta terra tem dono”, com outro significado, oposto, ao que faziam e fazem os latifundiários quando querem afastar os sem-terras. Mas, no passado, eles próprios invadiram terras indígenas sem nenhuma cerimônia.
Quero que você, leitor, não tome estas palavras como uma defesa dos sem-terra e sim como defesa do direito líquido e certo de propriedade dos meios de produção, o que inclui a não derrubada de árvores por exploradores da Amazônia ou a poluição de mares, rios e lagoas por empresários “bem intencionados” para com o “progresso”.
Este embate conquistador de espaços (legal e ilegalmente) persegue a história do homem desde quando ele se lançou atrás da primeira caça a abateu (conquistou-a) e foi servi-la como alimento de seu filho. Nunca mais paramos.
Em 1945, quando acabou a II Grande Guerra, o Brasil já estava refém de grandes indústrias estrangeiras e ficou ainda mais quando os Estados Unidos receberam a Américas como partilha de guerra. Frigoríficos como Swift, Armour, Anglo, moinhos e depois fábricas de óleos vegetais como a Samrig, empresas de energia elétrica, telefones e petróleo como a Light, ITT, Esso, Shel, Texaco, etc. exploravam livremente o mercado nacional e tiveram de modificar seu comportamento por conta da política de Vargas e Brizola.
Mas, os nacionalistas de Vargas, Brizola, Darci Ribeiro e outros, inclusive os românticos comunistas, não estavam à altura das transformações que pregavam, como Lula também não estava algum tempo depois.
Os exageros da esquerda despreparada levaram os militares ao poder, também com um discurso nacionalista, pífio.
Sob o “fogo cruzado” da guerra fria sofremos os embates do capitalismo versus comunismo e desembocamos no movimento “diretas-já”, porém devendo a alma para o capital internacional. Andamos de lado. Nem éramos capitalismo puro porque o Estado era e é um grande empreendedor e nem éramos comunismo puro porque a economia em boa parte é livre. Nem as privatizações do governo FHC conseguiram levar o Brasil a uma economia de mercado, de fato.
Como o dualismo vem marcando nossa história, não conseguimos ser um país capitalista e também não um país de esquerda, apesar dos governos eleitos do PT, um partido que se assume comunista, mas governa com a mão direita. Somos, na verdade, cópia. Cópia de uma esquerda que não atua, cópia de um capitalismo que não é real.
Tentamos ser originais em 1822, damos umas escaramuças em 1922, um pulinho em 1930, passamos por sopros de cá e de lá, mas somos cópais mal feitas ora de Cuba, ora da Inglaterra, ora dos Estados Unidos e... nada. Nada de independência real.
Em 1860 a Inglaterra determinou e nós fomos ao Paraguai mandar chumbo nos paraguaios que, de nação líder da América do Sul foi transformado nisso que você conhece.
Em 1940 os Estados Unidos determinaram e nós fomos mandar chumbo nos italianos, obrigando os netos de imigrantes atirar contra seus próprios primos.
Em 1950 os Estados determinaram e nós arrancamos os trilhos das ferrovias para incrementar a construção de rodovias destinadas a receber os caminhões deles. Vai chegar o dia em que os caminhões pararão por excesso de tráfego e o trem não andará por que não há trilhos.
Em 1996 a Inglaterra determinou e nós saímos a privatizar, isto é, a leiloar pelo método “quem dá menos” as nossas melhores estatais.
Você está satisfeito? Então não faça nada.

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