segunda-feira, 5 de março de 2012

Mas, tomemos alguns cuidados


32. A beirada da história e o retorno da política contestadora

O Fim do Fim da História não é o mesmo que o fim do neoliberalismo. Como já vimos antes, ideologias zumbis têm o seu modo de permanecer além de sua data de validade. Enquanto houver capitalistas (ou candidatos a capitalistas), sempre haverá uma forma ou outra de filosofia capitalista. O Fim do Fim da História não é tanto sobre a erradicação da visão de mundo individualista do capitalismo, que é impossível sem recorrermos ao tipo de tática de estado repressivo que nós estamos tentando superar, mas sobre A VOLTA DA POLÍTICA CONTESTADORA como característica definidora da vida social. Em outras palavras, o Fim do Fim da História não é tanto sobre superação da luta política, mas a descoberta de que, por definição, nós nunca podemos superar a luta política. Enquanto houver injustiça, haverá luta – e partir do fato que sempre haverá injustiça, sempre haverá luta.
Se as políticas e os políticos (estes a serviço do capital) não se pautarem pela justiça aos injustiçados, em tempos novos de transparência e justiça, resta sair às ruas e gritar. Enquanto a imprensa (que não é livre porque é paga pelo capital ou é estatal) não se posicionar a favor da democracia (verdadeira e não apenas da defesa do capital) e da Justiça (com J maiúsculo), só restará aos oprimidos pelo sistema pedir a mudança do sistema.
Primeiro seremos dois, depois seremos mil, mais tarde um pouquinho seremos um milhão. Você precisa acreditar nisso e retirar daqueles que fazem as leis o direito de legislar em causa própria.
O fim da história, portanto, não é nem possível nem desejável. O anseio por um estágio final de desenvolvimento institucional e ideológico é, ou puramente totalitário, ou puramente utópico. Enquanto certos anseios utópicos podem nos inspirar a nos elevarmos às mais altas esferas enquanto espécie, nós sempre teremos que nos lembrar que nenhuma ordem social é dada para sempre. Nossa Utopia deve sempre ser o desejo do espírito que nos põe em ação, mas nós temos que admitir o fato de que ela nunca pode se tornar uma realidade. A história simplesmente nunca acaba. Como o escolar neo-Gramsciano, Stephen Gill, colocou, “a história está sempre no fazer, num jogo dialético entre agente, estrutura, consciência e ação”. Ou, como o Subcomandante Marcos expressou de maneira mais poética: a luta é como um círculo: você pode começar em qualquer lugar, mas ela nunca pára”.
Em um excelente editorial do Guardian outro dia, Jonathan Jones observando uma foto da manifestação popular de Wall Street fez a seguinte observação arrebatadora: “Esta é uma fotografia de um ponto de virada na história, não porque o Movimento de Ocupação necessariamente obterá sucesso (qualquer sucesso que possa ser), mas porque ela revela a profundidade de novas possibilidades de debate em um momento que tão recentemente pareceu concordar sobre fundamentos econômicos. Esses movimentos inspiram que pode ainda se provar como um efetivo chamado à mudança, ou pode ser apenas fogo de palha. Não é esta a questão. E também pouco importa se o protesto está certo ou errado. O que importa é que o capitalismo desmedido, uma força que por seu dinamismo econômico parecia inquestionável, acima de reprovações ou reformas, um monstro que nos acostumamos a ser gratos por existir, repentinamente encontra toda sua feiúra amplamente comentada, exposta em meio às luzes de Times Square. O imperador da economia está nu”.
“Este é um momento inacreditável”, ele continua. “Se belisque”. O ano de 2011, com todas suas crises e revoluções, marca o que Slavoj Žižek em sua fala no Zuccotti Park, chama de “o acordar de um sonho que está se tornando pesadelo”. Marca o retorno da política contestadora. E, com isso, marca o Fim do Fim da História. Não que a história tenha parado por algum instante sequer – nós apenas ficamos confusos por um tempo por conta do colapso do arqui-rival do capitalismo, e pensamos que a história havia parado. Mas o fato é que a história que continua a se fazer está sendo capturada nas notícias de jornal, nas fotografias poderosas, e nas palavras de uma simples senhora de classe-média grega durante a greve de 48 horas de outubro: “Eu nunca fui de esquerda”, ela disse, “mas eles nos forçaram a nos tornar extremistas”. Quando o sistema força pessoas comuns a se tornarem revolucionárias, você sabe que não está mais no Fim da História. Você está bem na sua beirada.
Acorda leitor.
Você entende, agora, por que “este mundo” (velho) está acabando?
Era uma vez um mundo que teve escravismo, monarquia, feudalismo, república, teve parlamentarismo, teve fascismo, teve ditadura militar e religiosa, teve capitalismo, teve comunismo estatal, teve socialismo democrático, teve liberalismo, teve neo-liberalismo...
Tudo faliu. Tudo não deu certo.
Se você perguntar a alguém o que pode substituir tudo isso, ouvirá perplexo: “Nada substitui o capitalismo, nós somos movidos a lucro”. Mas ninguém questiona com quem o lucro está ficando. Esse cara da resposta se deu bem com o capitalismo ou não sabe nada de nada.
No dia em que o trabalhador participar dos resultados da empresa, inclusive dos bancos, talvez o capitalismo não precise ser substituído.
Caso contrário, esse é mais um motivo para que tanta gente esteja protestando e pedindo o fim desse tempo velho.

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